Israel e Jerusalém, sua Capital (em tempos modernos, desde 1949)

[NOTA: Este artigo, em sua primeira versão, foi publicado como post no Facebook em 7  de Dezembro de 2017. Revisado, e, portanto, em segunda versão, é colocado como artigo aqui também, no dia seguinte, 8 de Dezembro de 2018.]

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A história do povo judeu é longa e cheia de percalços. Uma boa parte dela é narrada na Bíblia, sem a pretendida objetividade da historiografia moderna. A história do povo judeu narrada no Velho Testamento é contada para mostrar que o povo judeu é o povo escolhido de Deus (chamado de YHWH, no Velho Testamento), a quem Deus teria dado um território (Canaã, a Terra Prometida, hoje a Palestina) e uma missão.

É muito difícil fazer sentido e compatibilizar as várias genealogias e os dados históricos contidos no Velho Testamento. Em regra, estima-se que, de Abrahão até a formação do reino de Israel, sob Saul, tenhamos um período de mais ou menos mil anos – o primeiro milênio da História do Povo Judeu.

Esse povo oportunamente se tornou um reino (por volta de 1000 AC), sob Saul, depois Davi, depois Salomão, filho de Davi, e outros reis menos conhecidos. Em um dado momento o reino se dividiu em dois, o do Norte e o do Sul, o primeiro chamado de Israel, o outro, de Judá (este com a capital em Jerusalém). Cada um dos dois reinos foi dominado, em diferentes momentos, por potências estrangeiras: o do Norte, pela Assíria, o do Sul, pela Babilônia. Nesses momentos de dominação, boa parte da população judaica foi deslocada, depois voltou, pelo menos em parte, para a Palestina. Em meados do último milênio antes de Cristo, Jerusalém, perto de Belém, cidade que a tradição considera como a Cidade de Davi, se firmou como a capital do que restou do território judeu.

Em algum momento, mais para o final do primeiro milênio antes de Cristo, a Palestina veio a ser ocupada pelos Romanos, que usavam, em regra, testas de ferro judeus para governar a província (como era o caso do tristemente conhecido Herodes).

Na guerra Judaico-Romana de 70-74, agora já na Era Cristã (AD), os judeus foram derrotados, expulsos da Palestina. Durante a guerra, o seu templo foi destruído, nunca mais tendo sido reconstruído desde então. Hoje, existem apenas suas ruínas – das quais o chamado Muro das Lamentações é a parte mais famosa. Com a expulsão dos Judeus da Palestina, em 70-74, começou o período chamado da Diáspora, termo que pode ser traduzido como Espalhamento. Os judeus que habitavam a Palestina se espalharam pelo mundo inteiro.

Assim, de Abrahão (quando teria começado a história do povo judeu) até sua Diáspora, em 70-74 AD, temos um período de mais ou menos dois mil anos. De 70-74 AD até hoje, temos outro período de mais ou menos cerca de dois mil anos (um pouco menos). Ao todo, a História do Povo Judeu parece cobrir quatro milênios. Convenhamos que não é pouco. É basicamente o dobro da História do Povo Cristão.

Por dois mil anos, depois da queda de Jerusalém, os judeus ficaram espalhados (“diasporados”) pelo mundo. Foram perseguidos quase em todo lugar em que decidiram se estabelecer. Isso se deu, em parte, porque, apesar de todas as suas desgraças, os judeus continuaram a se considerar o Povo Escolhido de Deus, ou seja, um contingente humano especial, destinado a um grande destino, infinitamente superior ao das demais nações (que constituíam os “gentios” – termo que quer dizer simplesmente “não judeu”).

Os cristãos, porém, viera a se considerar os verdadeiros herdeiros da História dos Judeus, alegando (principalmente com base em argumentos de Paulo, o apóstolo tardio) que Deus abandonou os judeus, por causa de sua infidelidade a ele, e transferiu sua escolha ou eleição para o povo cristão.

Criou-se, assim, uma rivalidade entre os cristãos, que começaram como uma seita judaica, e os judeus. Os dois movimentos sobreviveram, mas os cristãos se deram melhor, em especial porque vieram a ser escolhidos como a religião preferencial do Império Romano, em 313 AD, pelo Imperador Constantino I, e, depois, a única religião do Império Romano, em 381 AD, por decreto do Imperador Teodósio I.

A partir desse momento, fim do século 4, os cristãos começaram a perseguir os judeus, algo que continuou durante toda a história do Cristianismo. A acusação principal dos cristãos era de que os judeus haviam sido os principais responsáveis pela morte do também judeu Jesus de Nazaré, que, na fé cristã, veio, oportunamente, a ser considerado o Cristo (termo grego que quer dizer Messias, Ungido, etc.). A julgar pelo texto dos livros que vieram a constituir o Novo Testamento da Bíblia dos cristãos, a acusação procede. Resta saber se o Novo Testamento é confiável como fonte de informação histórica – mas essa é uma outra questão.

Durante a chamada Reforma Protestante, os judeus sofreram bastante, em especial nas mãos de Lutero, que escreveu tratados detestáveis contra eles, sendo, por essa razão, considerado por alguns como o pai do Antissemitismo moderno. Em pleno século das Luzes, o século do Iluminismo, os judeus foram difamados e perseguidos. Voltaire foi um dos grandes difamadores dos judeus nesse período. Mas ele disse coisas semelhantes sobre a Igreja Católica, segundo ele a infame, que deveria ser esmagada… (“Écrasez l’infâme”, foi o seu brado).

Nessas idas e vindas, chegamos ao século 20.

No final do século 19, começo do século 20, há um pouco mais de cem anos, portanto, teve início o movimento chamado Sionismo, que visava a reunir o povo judeu, na forma de uma nação, na Palestina, se possível reconstruindo um estado para essa nação, com um novo templo e tudo. Oficialmente o Movimento Sionista Internacional (World Zionist Organization) foi criado em 1897 na cidade de Basileia, na Suíça.

A partir do final da Primeira Guerra Mundial os britânicos derrotaram os turcos otomanos e assumiram controle da Palestina, que passou a integrar o Império Britânico (do qual se dizia, em virtude de sua extensão, que o Sol nunca deixava de iluminar uma parte dele, em qualquer ponto das 24 horas de um dia).

Já em 1917, com o final da Primeira Guerra Mundial já em vista, os britânicos emitem um comunicado, chamado de Declaração de Balfour, no qual se comprometem a criar, na Palestina, um “Lar Nacional” (“National Home”) para os judeus. Afirmam, porém, que isso será feito sem prejuízo dos direitos civis e religiosos dos demais povos que habitavam a Palestina – quase todos eles árabes e muçulmanos. Nessa ocasião, os britânicos atribuíram direitos iguais aos judeus que já habitavam a Palestina, tendo se mudado para lá em especial na sequência do Movimento Sionista.

De 1918 até 1939, quando começou a Segunda Guerra Mundial, houve um período de relativa tranquilidade na Palestina. Durante a guerra, muitos judeus europeus se mudaram para a Palestina, diante do antissemitismo nazista (e, portanto, para fugir do Holocausto) e diante das perseguições (pogroms) em outros países (especialmente na Rússia).

Depois da Segunda Guerra Mundial, a Organização das Nações Unidas (ONU ) foi criada para substituir a Liga das Nações, criada depois da Primeira Guerra. Em um de seus primeiros atos, a ONU decidiu criar, agora não mais apenas um Lar Nacional, mas, sim, um Estado judeu na Palestina. Obviamente, os povos que lá habitavam e seus aliados não queriam que isso acontecesse, mas os grandes vencedores da Segunda Guerra, Rússia, Inglaterra e Estados Unidos acabaram conseguindo criar esse estado no final de 1947 (em 29 de Novembro). Isso significava que haveria, na região, um Estado Judaico e um Estado Palestino. Em 1921 a Grã-Bretanha havia determinado que as terras na parte a Leste do Rio Jordão não deveriam ser ocupadas pelos judeus. Ao longo de 1948/1949 houve negociações para decidir os limites dos respectivos territórios dos dois Estados. Mas em 14 de Maio de 1948, horas antes de expirar o chamado Mandado da Grã-Bretanha sobre a região, foi proclamada, pelos judeus, a Independência (na realidade, a criação formal) do Estado de Israel. No mesmo dia os Estados Unidos reconheceram de facto o novo estado e em 17 de Maio a União Soviética foi além e o reconheceu de jure.

Uma proposta de criação de dois estados, um judeu e um palestino, feita pelos britânicos em 1937, teria dado aos judeus cerca de 25% do território da Palestina e, para os povos árabes que ali habitam (os chamados palestinos), 3/4 do território. Os judeus, que anteriormente não tinham território algum, aceitaram a proposta, apesar de ela representar bem menos do que eles pretendiam. Jerusalém, por exemplo, que sempre foi considerada a Cidade Santa dos judeus, ficaria em território que seria atribuído aos palestinos. Mas estes recusaram a proposta.

No dia seguinte ao da proclamação da Independência de Israel, ou seja, em 15 de Maio de 1948, uma coalisão composta por Síria, Iraque, Transjordânia, Líbano e Egito ataca Israel, naquela que veio a ser chamada de Guerra Árabe-Israeli, ou, simplesmente, Guerra da Independência de Israel de 1948-1949. O objetivo dos palestinos e seus aliados era varrer do mapa o estado dos judeus — agora oficialmente proclamado independente e nomeado Israel. Segundo Paul Johnson (A History of the Jews) a Liga Árabe declarou literalmente: “Esta será uma guerra de exterminação e um massacre sem precedentes na história”.

Embora o estado judaico estivesse ainda em sua primeira infância, tendo apenas um dia de existência, não estando nem mesmo totalmente organizado, tendo uma força militar relativamente pequena, e com armamentos inferiores aos dos palestinos e seus aliados, Israel se organizou rapidamente e venceu a guerra, com o apoio de alguns aliados. Israel poderia, na realidade, ter varrido do mapa os palestinos, mas não o fez. O resultado líquido dessa chamada Guerra da Independência foi que Israel aumentou consideravelmente o território sob seu controle. A divisão que, em 1937, havia sido sugerida como 25% para os judeus e 75% para os palestinos, agora era 50%/50% — fifty/fifty.

Finda a Guerra da Independência (vários armistícios foram assinados ao longo de 1949), houve perseguição aos judeus que viviam em outros países árabes e eles se mudaram, em grande medida, para o Estado de Israel. Quanto aos territórios, houve várias negociações, no período posterior ao fim da guerra, em que Israel esteve disposto a devolver alguns territórios conquistados na Guerra da Independência, mas os Palestinos queriam tudo de volta e se negavam a reconhecer a existência de jure do estado de Israel e reivindicam controle total da Palestina, assim fazendo com que até mesmo a existência de facto também fosse reduzida a nada.

Em 13 de Janeiro de 1949 Jerusalém é declarada a capital do Estado de Israel e o controle de Jerusalém é dividido entre Israel (parte ocidental da cidade) e a Jordânia (parte oriental da cidade).

[Parêntese: aquilo que Donald Trump reconheceu em 6/12/2017 é uma realidade que foi declarada em 13/1/1949.]

Em Maio de 1967 veio nova guerra, essa declarada pelo Egito, com o apoio de inúmeras nações árabes, envolvendo, inicialmente, a Península do Sinai, o Canal de Suez, etc. – a chamada Guerra dos Seis Dias. De 5 a 10 de Junho, Israel faz um ataque abrangente contra o Egito, a Jordânia e a Síria. Agora Israel estava preparado para enfrentar seus vizinhos e liquidou a guerra em menos de uma semana, conseguindo bem mais territórios do que tinha antes.

Tendo derrotado a Jordânia, que controlava a parte oriental de Jerusalém, Israel reunificou toda a cidade, mantendo-a sob seu comando. Isso se deu em 7 de junho, mais foi icomunicando oficialmente ao mundo apenas tr em 28 de Junho, a reunificação da cidade.

Diz Paul Johnson, op.cit., sobre o resultado da Guerra dos Seis Dias:

“Ao final da Guerra dos Seis Dias, Israel havia unificado Jerusalém e ocupado a margem esquerda inteira do Jordão. Ocupou também o Planalto de Golan na Síria e chegou a 30 milhas de Damasco. Na frente ocidental, ocupou toda a planície do Sinai. O resultado líquido da operação foi que, pela primeira vez, Israel conquistou fronteiras defensáveis, bem como uma capital unificada, e a maior parte dos seus famosos territórios históricos”.

Em 12 de junho de 1967 Israel declarou, formalmente, que não voltaria a reconhecer as linhas limítrofes firmadas no Armistício de 1949 — a menos que isso se desse como resultado de um processo de negociação amplo e formal, que reconhecesse a existência de Israel e lhe garantisse fronteiras permanentes. Israel agora faz exigências a partir de uma posição de força, pois controla cerca de 80% dos territórios da Palestina.

Em 1 de Setembro de 1967, os líderes dos países árabes se reúnem em Kartum, no Sudão, e dão sua resposta a Israel, aprovando uma declaração curta e grossa chamado de “The Three No’s”: “No recognition of Israel. No negotiations with Israel. No peace with Israel.”

Apesar disso, houve novas negociações, correção de algumas linhas divisórias, um breve período de paz.

Porém, durante o feriado religioso judaico de Yom Kippur de 1973, houve nova guerra, a terceira, Nesta Israel foi apanhado de surpresa, mas reagiu e venceu a guerra, ampliando seus territórios ainda mais. Essa foi a chamada Guerra de Yom Kippur, que durou de 6 a 24 de Outubro de 1973 e foi liderada pelo Egito e pela Síria, com o apoio de Força Expedicionária dos outros países árabes. O acordo de desengajamento militar com o Egito só foi assinado em 18 de Janeiro de 1974.

Depois dessa guerra houve uma tentativa séria de negociação, em 1978, liderada pelo presidente americano Jimmy Carter, negociação que resultou no chamado de Acordo de Camp David, firmado, entre Israel e o Egito, em 18 de Setembro de 1978. Do acordo resultou a retirada de Israel do Sinai e sua devolução ao Egito, basicamente encerrando as hostilidades entre os dois países. Os palestinos não quiseram participar. Nessa ocasião lhes foi proposta uma solução dos conflitos que envolvia (como proposto pela Grã-Bretanha em 1917), a existência de dois estados independentes, Israel e um estado palestino. Mas os palestinos insistiam numa “solução” que envolvesse a dissolução do Estado de Israel e a devolução dos territórios ocupados por Israel aos palestinos. Hoje, os palestinos lutam por isso, que lhes foi proposto, em 1978, mas eles então recusaram.

De lá para cá, têm havido várias operações militares entre Israel e seus vizinhos. Entre Junho e Dezembro de 1982, por exemplo, Israel invadiu o Sul do Líbano para combater as forças da Organização para a Libertação da Palestina. Na verdade, só em 24 de Maio de 2000 Israel veio a retirar totalmente suas forças do Sul do Líbano. Em 1987 os vizinhos palestinos atacaram Israel nas chamadas Intifadas. E assim teve continuidade o conturbado relacionamento de Israel com seus vizinhos árabes.

Encaminho-me para a conclusão.

Em junho de 1967, em decorrência de uma guerra formalmente declarada pelos árabes e provocada por eles, Israel ganhou vários novos territórios e unificou a cidade de Jerusalém, que, logo depois da criação do Estado de Israel, em 1947/1948, foi declarada, em 13/1/1949, sua capital (embora à época Israel só controlasse a parte ocidental da cidade).

Várias vezes, em especial nos Acordos de Camp David, os palestinos tiveram ocasião de ter um estado palestino reconhecido junto do estado judeu (Israel). Recusaram-se a aceitar essa solução, porque ela referendava a existência de Israel.

Agora hoje, momento em que Israel detém virtualmente a hegemonia da Palestina, os palestinos querem impor condições, fazendo de conta que Israel é intransigente por não aceitar os dois estados. A situação de fato, agora, é que Israel controla a maior parte da Palestina, detém controle unificado de Jerusalém, que é sua capital oficial desde 1949.

Que razão oferecem os palestinos hoje para que Israel aceite os dois estados e novamente divida Jerusalém, admitindo que a cidade seja também a capital do possível estado palestino? Só oferecem parar com o terrorismo — mas não têm moral nem credibilidade para oferecer isso, nem autoridade sobre suas várias facções para garantir que, fosse essa solução aceita por Israel, os palestinos, como um todo a respeitariam.

O que Donald Trump, o controvertido presidente dos EUA fez ontem, 6/12/2017, foi apenas declarar que os EUA reconhecem como capital de Israel aquela que já é a capital daquele estado há quase 60 anos. Quando Bill Clinton foi presidente dos EUA ele propôs e o congresso americano aprovou que isso fosse feito. Mas de lá para cá aquilo que o congresso americano aprovou vem tendo sua implementação adiada, a cada seis meses. Trump simplesmente resolveu acabar com a hipocrisia e a palhaçada. Que vai levar algum tempo para mudar a Embaixada, não resta dúvida. Essa é uma operação complexa, em especial num território complicado como Israel. Mas que vai ser mudada, vai. Quem não está contente, tem um direito: espernear. Pero no más que eso.

É isso.

Em São Paulo, 8 de Dezembro de 2017.

 

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